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Historinha

Era uma vez um número 01
Carolina Assis

Ilustração
Carolina Bassi

Era uma vez um número 01 muito tristinho. Não tinha com quem somar, com quem subtrair, com quem dividir ou até mesmo multiplicar. Era sozinho, sozinho...
Toda vez que passeava observava que outros números estavam, quase sempre, estabelecendo relações aritméticas das mais variadas.
A sina dele era ser o número 01. Sabia que podia encontrar em sua vida outro número para somar com ele as coisas boas, para dividir ou subtrair o peso da vida. Sonhava mesmo com a possibilidade de multiplicar, criar infinitos números a partir da soma que faria com sua companheira numerológica. Mas nenhum número era exatamente o que ele queria...
O número 02 parecia um pato, meio gordinho na cabeça, mas ele queria um número mais esguio, elegante; o número 03 dava sempre as costas para as pessoas, quis até formar um 13 ou um 131, mas esse número só estava aberto para um lado de qualquer questão, então, resolveu procurar aleatoriamente outro número que o aceitasse sobre todos os ângulos. Achou, sem querer, o número quatro em um teorema. Quis criar um jogo de quatro operações, mas quando percebeu estava preso, fechado em um quadrado, era muito sufocante.
Um dia encontrou o número 08, considerado na história antiga dos números, como um dos mais cabalísticos. Ele me dizia que não tinha problemas nas relações, pois gostava de todos os números com amor infinito e, que o problema do número 01 era justamente querer ser o primeiro em tudo, que ele não percebia que estava contido, isto é, que fazia parte do grande cosmo dos números. Na época, o 01 não entendeu direito. O jeito como o número 08 falava era sempre misterioso...
O número 01 não conseguia, na realidade, aceitar os números com suas particularidades, queria modificá-los dando um jeito de construir os milhares, as dezenas sempre a partir da unidade dele. Se não pôde ser 01....
Cansado de tanto procurar nos números algum que o completasse, resolveu não perder mais tempo e foi procurar um médico matemático. Dr. Pitágoras era excelente, falava com ele como um amigo íntimo, desses que não se encontra mais. Entretanto, a síndrome de ser sempre o número 01 não passava. Dizia que tentava mudar... Outro dia havia conseguido somar e subtrair ao mesmo tempo com dois amigos sem problema algum, mas no outro dia...
No outro dia ele encontrou o número 09, estava sozinho, decidiu conversar...Começou certinho a linha de raciocínio, quando resolveu mudar a lógica e cantar um trechinho do Tom Zé que dizia: “na matemática dos meus desejos, eu quero mais e mais e mais um beijo”...levou um tapão!
Assim desistiu de procurar Dr. Pitágoras e resolveu ficar sozinho mesmo. Seria sozinho, um número absoluto: o n° 01.
Passaram-se anos de contas infinitas e estava sempre sozinho, quando então, percebeu algo absolutamente diferente. Algo que nunca havia percebido do seu lado: o número Zero. 
O Zero SEMPRE esteve ao seu lado e ele nunca percebeu suas qualidades. E, quando percebeu sua gafe, ficou preocupado com a possibilidade de tê-lo feito sofrer, pois achava que zero a esquerda era nada...  esse tempo todo ele havia procurado outros números, quando o Zero estava ali, do seu lado.
O Zero dizia divertir-se, pois gostava de ver a busca do número 01. Era uma forma de compreender as operações entre os números, dizia ele, e que compreendia o fato dele não gostar o suficiente dele, pois para formar uma geometria perfeita era preciso considerá-lo como um número singular.
O número 01 nunca havia se sentido tão preenchido e nunca mais se sentiu sozinho, pois, agora, tinha consigo a melhor companhia do mundo: o Zero.

Sobre o autor:
Adriana Carolina Hipólito de Assis,
mestre em Literatura e Crítica Literária pela PUC/ SP.